Histórias das antigas

Luciano Nunes relembra histórias do passado ao lembrar de surfistas das antigas de Salvador


Foi em um daqueles dias em que você vai fazer o confere de manhã, vê que não tem nada, mas sente que o mar está estranho, se movimentando muito rápido e alguma coisa lhe diz: de tarde tenho que vir olhar de novo. Dito e feito. Início da tarde e aquele Barravento já era outro cenário. Aparentemente, continuava sem nada, um cara só na água e de repente, entra uma série varredora, do nada, fechando tudo (maré quase seca). O mar subindo depressa e todo bagunçado. O cara na água era Paulo Paquera (com uma Manoel Fernandez, que inclusive comprei depois, fina, 6 canaletas). Paquera, além de muito experiente e casca grossa, tinha um surf muito rápido, base estreita, sempre andando com muita velocidade. Sem dúvida, estava entre os melhores no seu tempo.

Vi Paquera pegar três ondas sem muito sucesso e pensei: se Paquera não está conseguindo passar as ondas, o que é que eu vou fazer nesse mar? Nesse momento, quem eu vejo descer a escada com um toco sinistro debaixo do braço? Chave de fenda ou Canoa para alguns, um iniciante na época. Não me diga que esse cara vai cair, pensei. Não é que entrou mesmo. Tive que esperar pra ver o resultado. Hum, não deu outra, uma das vacas mais hilárias que já vi. O arraste foi da arrebentação até a areia, na base do liquidificador extra power. E com isso, ele entrou para minha galeria dos maiores vaqueiros do Barravento, dividindo lugar de destaque com Soró e sua Phoenix, que tinha até fã clube e plateia cativa quando entrava naqueles dias mais bizarros, em especial na maré vazante, quando as esquerdas começavam a espalhar areia pra tudo quanto é lado; e com Alemão da Federação, que vacava com sua monoquilha pré histórica em meio às pedras e pinaúnas do Tonys como se estivesse na piscina de casa.

Veja, ser bom de vaca não é demérito nenhum, não é à toa que a WSL premia a vaca do ano. Não estou aqui depreciando os brothers, pelo contrário. Ser um vaqueiro significa que você tem muito go for it, é destemido e naquela fechadeira que todo mundo puxa o bico, você rema e despenca, e claro, se arrebenta né? Faz parte. É como aqueles kamikazes que ficam dropando o quebra coco na frente de Clark Little pra sair bem na foto. Só que lá no Barrá, não tinha foto, nem prêmio da WSL. Aí sim é roots, sou fã desses caras.

E por falar em destemor, lembrei de um cara que era exatamente o contrário dos vaqueiros. Simplesmente o sujeito não vacava de jeito nenhum. Ele surfava muito com uma Cristal Grafiti verde, vermelha e amarela. Só dropava no crítico e muita vezes em ondas que só tinham mesmo o drop. Acho que ele ficava se desafiando. Mas isso que estou falando é nos dias mais cabulosos, tanto no Tonys, quanto no Barravento. Às vezes eu imaginava: quero ver qual vai ser o dia que esse cara vai tomar uma vaca, assim, só para quebrar a monotonia. Esse dia nunca chegou. Claro aconteceu milhares de vezes, mas nunca presenciei. Não fiquei surpreso quando soube que tinha se exilado no Hawai e estava fazendo história no santuário de Waimea. O pôster dele na Fluir, muito merecido, com a gunzeira vermelha, resume e comprova o que estou escrevendo. Seu nome? André Rei, conhecido também como Vacilão (nunca entendi o porquê dessa alcunha, já que não vacilava no drop). Foi um dos precursores dos Mad Dogs, mas, muita gente da nova geração nem conhece.

Fazer história nas principais arenas de ondas grandes do mundo, esse também seria o destino natural de Heloy Júnior, isso é o que eu e muita gente pensa. Mas,o que está faltando para isso? Muita coisa, sabemos. O que não falta é vocação. E, aliás, posso dizer com meus muitos anos de praia, que talentos como esses aparecem uma ou duas em cada década. O quanto de veiculação midiática um surfista desses pode oportunizar em uma temporada havaiana? Será que não é interessante para uma empresa ter sua marca associada à performance de um atleta desse naipe?

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