Supremacia brasileira

Nosso colunista Lalo Giudice analisa a vitória de Gabriel Medina no Surf Ranch Pro


 
 Gabriel Medina vence a etapa do Surf Ranch na Califórnia. Foto: WSL


Antes de começarmos a resenhar sobre o quão foi espetacular, inédito e histórico a vitória do surfe brasileiro na piscina de onda do mito Kelly Slater, preciso dizer que precisei de um dia inteiro para curar minha ressaca emocional, um gengibre pra melhorar minha voz, além da oportunidade de rever algumas ondas importantes, acontecimentos nos bastidores e analisar a opinião de muita gente, atletas, jornalistas, sites especializados, free surfers e desse jeito, formar minha humilde opinião do que foi a 8º etapa do Circuito Mundial de Surf Profissional da WSL, o Surf Ranch Pro 2018, vencido por Gabriel Medina e com Filipe Toledo na segunda colocação. Tirei a segunda-feira toda para isso, mesmo não perdendo uma única onda se quer neste evento, como de costume.

Dessa vez foi pra valer. Após alguns testes na piscina de ondas, a WSL conseguiu fazer seu primeiro evento válido pelo Circuito Mundial de Surf. Foi um sucesso, sem dúvida alguma, mas precisamos frisar alguns pontos que ficaram visíveis e necessitam ser destacados.

Foi unânime a monotonia nos primeiros dias do evento, principalmente o primeiro. Os 18 piores ranqueados nesta temporada não conseguiram completar a maioria de suas apresentações, além de muita previsibilidade em seus movimentos.

Ficou bastante claro também que este evento pode e deve fazer parte do Dream Tour, porém com uma quantidade menor de atletas, talvez os dezesseis, os doze primeiros do ranking ou até mesmo os oito em um campeonato especial de fim de ano, assim como no tênis. Trinta e seis surfistas masculinos e dezoito no feminino ficou demais.

Com muitas apresentações para ser comparadas, o critério de julgamento foi bastante contestado entre a maioria dos atletas. O americano Kolohe Andino foi um dos que mais falou em público, além do sul-africano Jordy Smith, que até hoje posta em suas redes sociais que prefere o oceano, chegando até a ironizar um questionamento de seu amigo, o ex-surfista profissional Shane Beschen. Quando retrucado sobre o que achou das ondas do Rancho, o mesmo disse que até seu pai entubaria profundo ali e que não oferecia risco nenhum ao surfista. Engraçado que o discurso dele após a vitória do Founders Cup foi outro, mas segue o jogo.

Com ondas iguais para todos (era o que parecia ser), apesar do tamanho mediano, ficou muito claro quem realmente faz parte da nova ordem mundial do surf e deve permanecer por mais tempo no CT. Com a diminuição de muitas variáveis como tempo de bateria, ondas desiguais, além do formato mata-mata, a piscina de ondas do Rancho fez a estima de muito surfista ir pro "beleléu", como é o caso do australiano campeão mundial Joel Parkinson.

Parko, que já foi inspiração para surfistas de diversas gerações, aparenta lentidão em seus movimentos. Não, ele não está surfando menos que antes, tenho certeza disso. O surf é que mudou demais com a supremacia absoluta dos brasileiros, além de alguns lampejos de genialidade do sul africano Jordy Smith e do australiano Julian Wilson, os únicos que ainda batem de frente, poderíamos assim dizer. Na Gold Coast e Bells já estava ficando para trás, em Jeffrey´s já ficou e na piscina ficou estreito. Não posso dizer feio, pois não se encaixa com seu surf, mas já passou da hora de se juntar a seu amigo e 3x campeão do mundo Mick Fanning, que se aposentou no inicio do ano.

Voltemos a esmagadora vitória dos brasileiros no Rancho. Não tinha um que não apontasse Filipe ou Gabriel como campeões. Americanos, australianos, sul africanos, europeus, até mesmo o dono da piscina, o cara que treinou mais que todo mundo naquela arena e que já ganhou 11 titulos mundiais, a lenda Kelly Slater.

Era um duelo particular entre o líder e o vice-líder do ranking, do mais rápido surfista do mundo contra o mais completo surfista do mundo, do prodígio contra o fenômeno, de Filipe Toledo contra Gabriel Medina. Sim, verdade, não era uma final homem a homem, como segue o figurino, desta vez tínhamos mais seis coadjuvantes de luxo na final brigando no máximo pela terceira colocação.

No fim deu Gabriel Medina, que surfou mais que todos nas esquerdas e entubou com maestria nas direitas, além de um link de batidas e rasgadas com muita força e harmonia. Com duas vitórias seguidas, onze na carreira, Medina cola em Filipinho na corrida do titulo da temporada. Com um retrospecto incrível para as próximas três etapas restantes do Circuito, Medina é o grande favorito para ser o campeão mundial de 2018 em minha redundante opinião.

Filipinho com a segunda colocação no Surf Ranch Pro e em sua primeira final perdida, continua liderando o ranking. Pecou em suas ondas para a esquerda e viu o titulo da etapa escapar ali. Fez a melhor onda do evento como todos nos esperávamos, um 9,80. Nesta minha segunda- feira sabática, como expliquei no primeiro parágrafo, fiz questão de ver essa onda várias vezes e sinceramente, não daria um 10 também. O primeiro aéreo logo no inicio da onda saiu baixo, sendo inferior aos de Kolohe Andino e Kanoa Igarashi, realizados nesta mesma seção. Depois fez um tubo bem encaixado, porém não muito profundo, seguido de um alley oop com pouquissima amplitude, sendo ajudado ainda pelo ventinho terral, que facilita este tipo de manobra. Algumas batidas e pequenos floaters em seguida e mais um novo alley oop, esse sim muito alto. O conjunto foi muito bom, sem dúvida a melhor onda do evento, mas não foi perfeita. Desta vez concordei com os juízes.

Agora é focar nas próximas três etapas, onde ano passado acumulou três 25º colocações seguidas.

Outro que representou muito bem a bandeira brasileira foi Miguel Pupo. Participando mais uma vez como wildcard, o paulista de Maresias chegou honrosamente entre os 8 primeiros, terminando a prova em 5º lugar. Agora é focar nas etapas do QS e nas últimas 3 etapas do CT, onde permanecerá correndo como convidado.

Yago Dora por pouco não chega na grande final. Surfou muito de frontside e também foi outro brazuca que ficou precisando trocar a direita. Com mais um 9º na temporada, Yago já figura entre os 22 melhores surfistas do mundo que se mantém para o ano que vem.

Italo Ferreira como era de se esperar, quebrou de backside, porém seu frontside precisa de um refinamento. Muito kick na prancha, manobras sem link algum, além de uma leitura de onda equivocada, não fez um grande evento. Mais um 13º na temporada e a chance do primeiro titulo mundial cada vez mais distante.

Willian Cardoso, que incorporou o verdadeiro Panda, como mostrou em suas entrevistas vestido a caráter, faz sua segunda vigésima quinta colocação no ano. Surfou bem de backside, mas pecou em seu frontside, principalmente nas seções tubulares.

Adriano de Souza, Tomas Hermes, Ian Gouveia e Michael Rodrigues terminaram em 13º, Jessé Mendes e Wiggoly Dantas, que não conseguiu se encontrar na piscina, terminaram na 25º colocação.

Em outubro voltaremos ao oceano com o inicio da perna europeia. Teremos enchente, secante, dias com onda e dias sem onda, coral, areia ou pedra, tudo junto e misturado e além do gengibre, que acalma nossos gritos de vitória, precisaremos de algo que acalme nossa euforia, nossa ansiedade e corações, pois o que Gabriel fez com a torcida brasileira na etapa de Teahupoo, virando na última onda, no último minuto, não se vê e não se sente em nenhuma piscina de onda do mundo. É improgramável.

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