Saquarema soberana

Nosso colunista analisa a etapa brasileira e a vitória de Filipe Toledo nas ondas perfeitas de Saquarema


Filipe Toledo deu um show nas ondas da Barrinha, em Saquarema. Foto: WSL


Fim de papo em Saquarema, mais uma etapa do Circuito Mundial de Surf foi para conta e muita história para relatar desse emblemático evento, que ficará marcado na memória dos atletas e principalmente na nossa.

O templo sagrado do surf nacional pela terceira vez na história recebeu os melhores surfistas do mundo, só que dessa vez com tapete vermelho e rosas brancas, selando de vez o casamento entre a WSL e Saquarema. Dúvidas sobre a manutenção da etapa na pacata cidade da Região dos Lagos, a volta para a poluída praia do Postinho na Barra, ou até mesmo o regresso para Santa Catarina, não existem mais e não deverão entrar em pauta nos debates de mesa de bar, fanatismos exacerbados em conversas de grupos de Whatsapp ou até mesmo na própria diretoria da entidade máxima do esporte, a WSL.

Saquarema mostrou e comprovou para o mundo, até mesmo para os mais pessimistas, que é sem dúvida a melhor onda do Brasil. Encheu de orgulho seu país, seus "filhos do mar" como Raoni Monteiro, Lucas Chumbo, Marcos Monteiro e muitos outros surfistas da região, com altas ondas e mais do que isso, apresentou para o mundo a até então desconhecida Barrinha.

A Barrinha bombou, quebrou clássico, cristalino, tubular, entretanto pesado, com junções impiedosas e uma certa quantidade de espuma nos trilhos das ondas. O apelido que os gringos deram "Unrule beach break" ou pico sem regras, maximiza muito bem a forca que estas ondas atingem. Quando lembramos da passagem do Circuito Mundial pelo Brasil, ou por algum evento marcante que aconteceu com altas ondas, não me recordo de termos visto algo semelhante nesses quase 25 anos acompanhando o Circuito. Até a considerada melhor onda da história do Brasil, surfada pelo mito Kelly Slater em 1997 na Barra da Tijuca, onde o mesmo fez um tubaço em pé, finalizando a onda com um floater de quase 5 segundos em uma onda com sólidos 8 pés, começam a escapar das lembranças dos especialistas, fanáticos e caxias de plantão.

Sem muito patriotismo, “no duro”, muito dessa amnésia evolutiva se deve ao pernambucano Ian Gouveia, que pra mim fez a melhor onda surfada da história do Brasil em eventos válidos pelo WCT. Além de um tubo muito profundo e longo em uma bomba, Ian teve a capacidade de acertar uma das maiores batidas já vistas em mundiais. Voltou com perfeição, parecendo um atleta de ginástica olímpica, com pés juntos e paralelos, além do corpo envergado. Foi espetacular. O pernambucano, que não havia passado nenhuma bateria esse ano, terminou com um honroso 9º lugar. Tirou dois ex campeões desta etapa, Adriano de Souza e Jordy Smith e vai confiante para Keramas, palco da próxima etapa do Circuito Mundial.

O cearense Michael Rodrigues também fez um grande resultado em Saquarema. Com mais um 5º este ano, Michael já é o 7º do ranking e já entra na briga pelo prêmio simbólico da WSL de Rookie of the Year ou novato do ano. O pico de Keramas tem tudo haver com seu surf e mais um grande resultado não seria novidade pra esse arrojado surfista.

Yago Dora também foi longe, tirou o então líder do ranking Italo Ferreira no round 3 e só foi parado pelo havaiano Zeke Lau nas quartas. Por pouco Yago consegue igualar seu melhor resultado na carreira, um 3º lugar, feito este que aconteceu na mesma arena, porém em 2017. Vai pra Bali com mais confiança e tem tudo para fazer dois grandes resultados em águas índicas.

Nosso campeão de 2014 e um dos grandes favoritos ao titulo do Oi Rio Pro 2018 sucumbiu também nas quartas, diante do potente ex campeão australiano junior, Wade Carmichael. Medina, literalmente não se encontrou nesta bateria, escolheu mal suas ondas, errou aéreos e movimentos simples. Fez uma das piores baterias de sua vida, se não for a pior. De qualquer forma, uma 5º colocação foi muito importante para a corrida do titulo mundial. Desde 2014 que Gabriel não tem um começo animador como este. Já esta na quarta colocação do ranking e não me impressionaria se saísse de Bali com a lycra amarela. Continua sendo pra mim e para os especialistas, em análise combinatória, o favorito para a corrida do titulo mundial desse ano.

Italo Ferreira, que era o líder do ranking, além dos restantes dos brazucas, que não foram citados nesta coluna, não fizeram um grande evento, não ultrapassando o round 3 do Oi Rio Pro.

Já o grande campeão, o paulista Filipe Toledo, mais uma vez, mostrou que está no auge de sua carreira. Mesmo dando um susto no round 3, onde passou com míseros 6,90 pontos, mas conseguiu dar a volta por cima e aniquilar um por um, com muita propriedade até a grande vitória na Barrinha. É a segunda vitória de Toledo no Brasil e a 6º na carreira. Toledo vem mostrando evolução em seu surf ano a ano e já segue como um fortissimo candidato pare o titulo desta temporada. Aparentemente mais pesado, com quadris e pernas mais fortes, Filipinho, que nunca perdeu em finais, já assume a vice liderança do ranking, atrás apenas do australiano Julian Wilson. Em Keramas vem como franco favorito, já que a onda balinesa é uma das mais progressivas do Tour.

Entra as meninas, a 6x campeã do mundo, a australiana Steph Gilmore, ganhou pela primeira vez em águas tupiniquins e dispara na liderança do Tour. Parece que tudo se encaminha para o 7º titulo mundial desta simpática australiana. Caso isso ocorra, Steph irá igualar o número de vitórias da também australiana Layne Beachley. Entre as brazucas, Tati Weston-Webb estreou com pé direito, defendendo a bandeira canarinho, terminando com um honroso 3º lugar. Nossa guerreira Silvana Lima fez mais um bom resultado no ano, perdendo nas quartas em um confronto totalmente brasileiro, finalizando na 5º colocação na prova.

Que venha Bali com suas ondas, costumes, arquitetura e uma dose extra de misticismo, que estão sendo aguardados por todas as estrelas do elenco da WSL. “You can´t script that”, ao pé da letra, “você não conseguirá descrever isso,” só valerá se nosso prodígio, Filipe Toledo, não fizer final, pois na final, é saco!

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