RIP Rodrigão

Gabriel Macedo presta linda homenagem ao amigo Rodrigo Barretto


Rodrigo Barretto no Chile. Foto: Arquivo pessoal


Este texto vai ser o mais difícil que já escrevi na vida. Há mais de 20 horas tento escrever alguma coisa, mas não consigo. Uma tristeza imensa me toma a cada palavra digitada, uma perda muito grande para todos nós que permanecemos nesse plano. Quero lembrar de Rodrigão como o cara guerreiro que ele foi com a vida. Sei que é impossível transmitir em poucas palavras, mas vou tentar pela alegria que ele sempre nos passou.

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Bem, início dos anos 80, começo dos anos dourados do surfe ilheense, se aproxima um moleque loirinho com estereótipo de um mini surfista com rosto de "Baby Johnson" e pergunta se a galera, que estava sentada no banco da pracinha de Ilhéus, surfava. Ele devia ter uns 11 anos mais ou menos. Soltaram várias piadinhas, mandaram ele sair fora, mas, ousado do jeito que era, permaneceu no local sem se intimidar e ali ele virou mais um da turma, antes mesmos dos seus irmãos mais velhos, que também já davam seus primeiros passos no surfe.

Rodrigo sempre foi destemido em suas atitudes. Não media palavras, tinha uma personalidade forte e era sincero. Arrebentava no skate, na bike e no patins, mas foi pelo surfe que ele se apaixonou. Alguns não entendiam de onde vinha tanta força e isso transpareceu no seu surfe. Começou a competir em meados do anos 80 e os bons resultados vieram tão rápido que acho que nem ele esperava.

Pense em um cara bruto, então triplique. Seu surfe era tão forte que muitos não acreditavam que ele era Mirim (Sub 16), pois sempre foi alto e forte para os padrões da molecada da época. Travou duelos acirrados nas competições e também abandonou cedo seu talento como competidor, mas o power surf nunca o abandonou. Gostava de ser testado a todo momento, desafiava qualquer profissional quando o mar estava daquele jeito nada amigável. Seu estilo inconfundível era de deixar qualquer um perplexo com sua radicalidade.

Le Bufa, Urso e tantos outro apelidos como era conhecido no meio do surfe, viveu uma realidade na sua adolescência que lembrava um astro de Hollywood: boa pinta, carro, moto, skate, prancha, festas, garotas, amigos, viagens… tinha tudo isso a seu alcance e com uma intensidade extrema, mas nunca foi apegado a bens materiais. Ele gostava era de curtir a vida de forma simples, humorista de carteirinha. Tinha sempre uma piada na ponta da língua, risadas garantidas quando encontrava algum sobrevivente da pracinha (fiquei devendo essa matéria a ele sobre a pracinha, sempre me pedia para fazer).

A primeira impressão de quem o conhecia era de um cara marrento e bruto, mas bastavam poucas palavras para saber que atrás daquele urso havia um ser humano de coração mole, brincalhão, honesto, inteligente e muito talentoso. Quando foi morar em Salvador para dar continuidade aos estudos, conheceu seu amigo e shaper Mauricio Abubakir e ali encontrou um ídolo para puxar seus limites. Surfou ondas grandes incríveis e perigosas com uma certa facilidade, conseguiu respeito e admiração dentro e fora da água na capital.

Quando se formou Designer, entrou no ramo e foi destaque tão rápido como tudo em sua vida. Ultimamente ele estava engajado na reconstituição da lavoura cacaueira. Fui a algumas palestras dele e fiquei feliz em vê-lo dissertando com tanta sabedoria e inteligência sobre o assunto. Virou referência nacional tanto economicamente quanto politicamente. Paizão de Otto e sempre apaixonado pela esposa Carol, sua família vinha sempre em primeiro lugar.

Morou em Itacaré e lá se tornou apaixonado pelo pico de Jeribucaçu e defensor com unhas e dentes da preservação do paraíso. Peço desculpas por não me alongar mais. Teria que escrever milhares de páginas e não conseguiria descrever a verdadeira alma desse amigo irmão.

Está sendo difícil escrever sobre um amigo que se foi tão cedo e de uma forma inimaginável, mas estive revendo alguns posts dele no Facebook e estou deixando um que vai resumir um pouco da sua alma de guerreiro irreverente e apaixonado por tudo o que fez na vida.

Obrigado, meu amigo, por nos ter proporcionado momentos inesquecíveis. Continue iluminando os caminhos de todos nós que ficamos nesse lado de cá. Aloha e descanse em paz!! RIP Rodrigo Barreto.

Post de Rodrigo no Face em 18 de março de 2013

"pra quem ta na casa dos 40, minha geração do surf, ai vai um survival do que mais assistimos antes e depois das sessões de surf, antes de dormir e assim que acordava, antes do surf na madruga. sei cada manobra em cada parte da trilha sonora. devo ter visto umas 1000 vezes, que eu lembre. especulávamos a entrada do swell pelo peso na atmosfera, direção da ondulação, formação das frentes frias que avistávamos no horizonte e botando pilha uns nos outros. e sempre tinham altas... talvez o pensamento positivo em coletivo trouxessem aquelas ondas..

essa geração foi abençoada no surf, éramos mais livres das marcas, eramos cabeludos, com o nariz em brasa, caixa do peito pegando fogo e as costas rachadas de sol. surfávamos sempre com a mesma prancha, biquilhas, a maré de março começava no dia 1º de março, de manha espigão, a tarde catedral, sempre tinha onda. fim de semana norte shore ou backdoor e qdo rolava uma carona barril, itacaré pra acampar na tiririca, se chovesse, fudeu tudo: perdia aula, tomava cascudo qdo chegava, mas valia sempre a pena.

os surfistas de ilhéus tinham um alto novel tecnico, mas tinham uma caracteristica de não sairem pra surfar fora daqui. qdo os "artistas" que ja apareciam nas duas revistas que rolavam, brasil surf e visual, vinham correr os campeonatos que rolavam aqui, geralmente tomavam escovada da galera mirim, a não ser quando em 84

chegou um opala 4 portas, com 4 maloqueiros surfistas, picuruta, almir, taiu e bambu para competir na copa do cacau de surf, no backdoor. picuruta fez final com janio, levou porque era celebridade, mas tomou o maior calor e ganhou por décimos. assisti das pedras e lembro bem das ondas. a linha de surf que vi picuruta apresentar, mudou os parametros de como surfaríamos dali pra frente. encorporei o base/lip pra sempre e ainda os tenho como inspiração. não so eles mas como todos os amigos que fiz naquela época. obrigado a todos por tudo que me fizeram viver.

paulinho, mauricio, gabriel, caubundinha, gaiá, duda, macoinha, homevelho, janio, adalvo, bricio, culão, jacustô, raildinho, kalay, canjica, alvarenga, nariga, rosoleta, pitú, nadador, dão, barrão, negoadilson, paudebosta, aurelio, jjjjjjay, rarã, lepra, magid, zeluiba, marquinhos, bigode, boi, caradegato, lelé e ricardo e mais uma porrada de figuras que fizeram parte da minha formação. valeu mesmo!

depois que apareceu o dvd e a internet, muita coisa mudou, mas sindo saudades daqueles unicos filmes VHS e daquela energia positiva pra fazer o swell entrar.
"

*Texto escrito em 15 de setembro de 2015 por Gabriel Macedo, amigo de Rodrigo Barretto.

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